Introdução do Shin Budismo da Terra Pura (Jodo Shinshu)
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Com a idade de nove anos Shinran Shonin ordenou-se sob orientação de Jichin, o sacerdote-chefe do Templo Shoren-In de Quioto. Pouco tempo depois foi para o Monte Hiei, a nordeste da cidade, para estudar e praticar o Caminho Busista. O Monte Hiei era o centro da prática budista, desde que Saicho (767-822), postumamente chamado Dengyo Daishi, lá construiu o templo principal iniciando a Escola Tendai do Japão. Vários eminentes mestres ali surgiram, entre os quais En-nin (792-862), notável por seu diário Viagens na China T’ang (traduzido para o inglês pelo Dr. E.O. Reischauer, ex-embaixador americano no Japão). Guenshin (942-1017), considerado pelos chineses como o “Tathagata Guenshin, o pequeno Sakyamuni japonês” em virtude de sua obra Ojo Yoshu, (“Coletânea de Passagens Essenciais Sobre o Nascimento”), foi um estudioso de Tendai no Monte Hiei. Honen (1133-1212), o fundador da Escola Jodo (Terra Pura), também ali estudou em busca do Caminho da Iluminação até que deparou com uma inspiradora passagem nos comentários de Shan-tao (613-681) sobre o Sutra da Contemplação do Buda da Vida Imensurável quando, então, sua busca espiritual se encerrou.
Como seus predecessores, Shinran também era um dedicado buscador do Caminho. Ele estudava atentamente os sutras e discursos dos mestres, e ponderava a respeito do princípio da Verdade Budista nas práticas meditativas e disciplinas com o método de Tendai. Aspirando aos elevados ideais de atingir a Iluminação de Buda que transcendem a limitada condição humana, ele se desafiava em numerosas tentativas desesperadas contra a muralha que separa o mundo absoluto do relativo. A muralha, de fato, era sua ignorância e as paixões maléficas. Quanto mais praticava, mais se afastava da Ilumianação de Buda e quanto mais profundamente refletia, mais escuras eram as nuvens das paixões pairando em sua mente.
Desapontado e desamparado, começou a frequentar o Rokkaku-Do, um templo situado no centro de Quioto e construído pelo Príncipe Shotoku (574-621), onde Nyoirin Kannon (Bodhisattva Cintamanicakra Avalokitesvara) está entronizado. Noite após noite, ele rezou ao Príncipe Shotoku e ao Kannon para que o caminho lhe fosse revelado. O ardor da prece foi respondido quando no alvorecer do nonagésimo quinto dia, recebeu de Kannon as palavras inspiradoras assegurando-lhe a proteção por toda vida. Então, procurou um mestre que lhe mostrasse o verdadeiro caminho para Salvação. Quando ouviu falar do ensinamento do Nembutsu proposto por Honen, foi vê-lo.
Honen foi o primeiro a declarar publicamente a independência do ensinamento do Nembutsu que antes era apenas uma prática das escolas tradicionais, ao escrever o Senjaku Shu (o título completo, Senjaku Hongan Nembutsu Shu, “Coletânea de Passagens Sobre o Nembutsu do Voto Original Selecionado”). Honen era um mestre idoso com sessenta e nove anos de idade quando Shinran, quarenta anos mais jovem, o visitou. Nele Shinran descobriu o caminho que o levaria ao encontro com o Buda Amida. Mais tarde, ao reafirmar como é difícil encontrar um verdadeiro mestre, diz em um hino:
Difícil é encontrar um bom mestre;
Difícil, também é para ele, instruir.
É difícil ouvir corretamente (o ensinamento);
Muito mais difícil é nele confiar. (Jodo Wasan 69)
Previamente, no Monte Hiei, Shinran praticara o Nembutsu como un dos quatro samadhis da tradição Tendai, que consistia em recitar o Nome de Amida tendo o Buda em mente enquanto se caminha em volta da imagem de Amida no templo fechado. Portanto, o Nembutsu não era novidade para ele quando o ouviu através de Honen. Mas o Nembutsu de Honen soava completamente diferente para ele, e de fato o era. O Nembutsu que Shinran praticara no Monte Hiei era baseado na sua fé e no seu esforço; e recitava o Nome Sagrado com a finalidade de atingir a serenidade da mente. Honen inverteu esta interpretação e ensinava o Nembutsu baseado no Voto Original de Amida e salvação pela Sua Compaixão. Porém, Shinran encontrava-se agora diante de outra muralha –diferente da muralha que o confrontara no Monte quando tentava atingir à Iluminação pelo esforço próprio. A nova muralha era como entregar-se totalmente ao Voto de Amida renunciando o seu esforço próprio.
Através da bondosa instrução de Honen, Shinran analisou sua inconsciência e percebeu sua errônea dependência no seu poder próprio que jamais atingiria ao absoluto. Refletiu e compreendeu que, tentando se aproximar de Amida, estava recusando Sua Compaixão Universal e simplesmente tateava cegamente enquanto a Luz da Sabedoria brilhava ilimitadamente. Sua ilusão do ego esmoreceu na medida que a Luz de Amida atingiu sua mente. Sua crença no poder próprio foi convertida pela Mente Confiante no Outro Poder.
A Conversão ao Ensinamento do Outro Poder foi o mais essencial acontecimento na vida de Shinran, pois marcou o fim de seus vinte anos de busca pelo caminho através do seu esforço próprio e foi o ponto de partida de uma nova vida, digna de ser vivida. Sua vida, antes de ser correspondida ao Voto de Amida, era sem sentido e cheia de angústia. Sua nova vida, vivificada e salva pela Ilimitada Sabedoria e Compaixão de Amida, foi dedicada à difusão do Budismo da Terra Pura. Sua alegria na Mente Confiante, e gratidão ao Buda e aos mestres, deram também lugar para a dedicação acadêmica para sistematizar o ensinamento do Nembutsu. Ele pesquisou sutras, discursos e comentários, especialmente os da Terra Pura, e mais tarde, compôs a sua obra princial, o Kyo Gyo Shin Sho.
Extraído do “Jodo Wasan, Hinos da Terra Pura”, publicado pelo Hongwanji International Center, 1995, com algumas modificações e a ser continuado nas próximas edições.